Critérios de Sgarbossa – Aprenda a identificar Infarto no Bloqueio de Ramo Esquerdo (BRE)

Quem trabalha em emergência sabe bem que um dos grandes desafios no pronto socorro é a avaliação de dor torácica. A principal patologia para ser diagnosticada ou descartada nesse grupo de pacientes é o infarto agudo do miocárdio. Como propedêutica para esse diagnóstico é realizado incialmente uma anamnese/exame físico, exames laboratoriais com marcadores de necrose miocárdica e o eletrocardiograma (ECG). No ECG é muito importante avaliar se o paciente apresenta critérios que o caracterizem como infarto com supradesnivelamento do segmento ST pois nesse caso estaria indicado terapia de reperfusão miocárdica (através de angioplastia ou trombolítico). Se realizar esse procedimento no tempo hábil (primeiras 12 horas do início da dor) o paciente pode preservar músculo cardíaco, com diminuição da mortalidade.

Uma grade dificuldade nessa investigação é quando o paciente com dor torácica apresenta Bloqueio de Ramo Esquerdo (BRE), mascarando algumas alterações no eletrocardiograma

Em 1996 Elena Sgarbossa e colaboradores publicaram no The New England Journal of Medicine o artigo “Electrocardiographic diagnosis of evolving acute myocardial infarction in the presence of left bundle-branch block”. Nesse artigo eles avaliaram eletrocardiogramas de pacientes com Bloqueio de Ramo Esquerdo que tiveram infarto documentado no banco de dados do famoso estudo GUSTO-1 (Global Utilization of Streptokinase and Tissue Plasminogen Activator for Occluded Coronary Arteries)  e compararam com grupo controle de igual quantidade composto por pacientes com doença coronariana estável angiograficamente documentada e que também apresentavam BRE. Os pacientes do grupo controle não apresentavam dor torácica no momento da aquisição do ECG.

Sgarbossa e col. demonstraram 03 critérios diagnósticos para presença de Infarto do Miocárdio com Supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST) no paciente com BRE. Cada um dos critérios apresenta uma pontuação e o valor é mais alto quanto maior a probabilidade do achado corroborá com um resultado verdadeiramente positivo. Para o diagnóstico do infarto no BRE ficou estabelecido uma pontuação maior ou igual a 3 (Especificidade de 90%). Os 03 critérios estabelecidos foram os seguintes:

  1. Elevação do segmento ST ≥ 1mm com concordância na direção do complexo QRS (supradesnivelamento apresenta mesma direção do QRS): 05 pontos
  2. Depressão do segmento ST ≥ 1mm nas derivações V1, V2 e V3: 03 pontos
  3. Elevação do segmento ST ≥ 5mm e discordância do complexo QRS (supradesnivelamento apresenta direção oposta do QRS): 02 pontos
Critérios de Sgarbossa
Os traçados do lado esquerdo representam exemplos de complexos QRS encontrados no BRE; Nos traçados do lado direito correspondem a exemplos de alterações no BRE relacionado aos 03 critérios de Sgarbossa.

CRITÉRIOS DE SGARBOSSA MODIFICADOS

Em uma revisão sistemática foi observado que se a pontuação dos Critérios de Sgarbossa eram maiores ou iguais a 03 a especificidade era alta (98%) porém a sensibilidade era de apenas 20%. Quando a pontuação era maior ou igual a 02 a sensibilidade apresentou variação de 20 a 79% e a especificidade de 61 a 100%. O terceiro critério do Sgarbossa corresponde a uma elevação do segmento ST ≥ 5mm, sendo discordante da direção do QRS. Esse critério apresentava uma pontuação de 02 e é o único dos 03 critérios de Sgarbossa que isoladamente não confirma IAMCSST no BRE (positivo se ≥ 3 pontos). Em 2012 Smith e colaboradores realizaram um estudo propondo mudança nos critérios originais do Sgarbossa. O Terceiro critério de Sgarbossa foi substituído pela relação da amplitude do segmento ST sobre o tamanho da onda S (ST/S). Esse critério é considerado positivo se a relação apresentar resultado de ≤ -0,25, ou seja, a relação do segmento ST sobre a onda S tem que ser maior que 25%. Se por acaso o paciente apresentar um infradesnivelamento do segmento ST discordante do complexo QRS, pode ser realizado a relação ST/R e verificar se a relação é maior que 25% (critério positivo). Essa mudança nos critérios ocasionou um aumento da sensibilidade e especificidade em relação aos critérios originais de Sgarbossa.

Então de acordo com os Critérios de Sgarbossa modificados, a presença de um deles já caracteriza como IAMCSST no BRE:

  1. Elevação do segmento ST ≥ 1mm com concordância na direção do complexo QRS (supradesnivelamento apresenta mesma direção do QRS)
  2. Depressão do segmento ST ≥ 1mm nas derivações V1, V2 e V3
  3. Relação do supradesnivelamento do segmento ST sobre a amplitude da onda S (ST/S) maior que 25% (Discordância do ST/S tem que ser ≤ -0,25)
Critérios de Sgabrossa Modificados
Critérios de Sgarbossa Modificado. Em relação aos Critérios de Sgarbossa original foi modificado apenas o terceiro critério. Ao lado dois exemplos de como avaliar o critério que foi modificado.

REFERÊNCIAS:

1- Sgarbossa EB, Pinski SL et al. Electrocardiographic diagnosis of evolving acute myocardial infarction in the presence of left bundle-branch block. N Engl J Med. 1996; 334: 481–487

2- Smith SW, Dodd KW et al. Diagnosis of ST-elevation myocardial infarction in the presence of left bundle branch block with the ST-elevation to S-wave ratio in a modified Sgarbossa rule. Ann Emerg Med. 2012; 60: 766–776

Autor

Dr. Antonio Amorim

Cardiologista dedicado ao diagnóstico, tratamento e prevenção de doenças do coração. Com uma sólida formação acadêmica e anos de experiência em sua área

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